Tuesday, November 09, 2004

...rosas frescas caídas na margem



...e ao chegar lá cima vi o tecto a abrir-se e saímos juntas. Lá fora amanhecia, o céu estava pintado a pinceladas de ouro e a paisagem estendida aos nossos pés refulgia, recém-lavada pela chuva. Voamos sobre vales e montes e descemos por fim no bosque das antigas sequóias, onde a brisa soprava por entre os ramos e um pássaro atrevido desafiava o inverno com o seu canto solitário. A Paula apontou-me o riacho, vi rosas frescas caídas na margem e uma poeira branca de ossos calcinados lá no fundo e ouvi a musica de milhares de vozes a sussurrar entre as árvores. Senti-me a mergulhar naquela água fresca e apercebi-me que a viagem através da dor terminava num vazio absoluto. Ao diluir-me tive a revelação de que esse vazio está cheio de tudo o que o universo contém. É nada e é tudo ao mesmo tempo. Luz sacramental e escuridão insondável. Sou o vazio, sou tudo o que existe, estou em cada folha do bosque, em cada gota do orvalho, em cada partícula de cinza que a agua arrasta, sou a Paula e também sou eu própria, sou nada e tudo o resto nesta vida e noutras vidas, imortal.

Adeus, Paula, mulher.
Bem-vinda, Paula, espírito.
* * *
Ultimas palavras do livro Paula

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